03/01/2020

Caminho descalço sobre a pedra. A pele a arder sobre o frio da madrugada.
Caminho como se parar fosse a mais impensável de todas as possibilidades.
Pe ante pé, numa aresta feita de gelo fino que atravessa o lugar mais recôndito do interior da minha alma.
Caminho como se caminhar fosse o único prenúncio possível. Como se seguir fosse a última inevitabilidade. Como se continuar pudesse ser o meu derradeiro reduto.

Sinto no corpo a vertigem que vem com a inevitável certeza da queda sobre o abismo que se abriu por dentro de mim.
Há uma distância que o meu corpo sente como intransponível e minha razão aceita como a condenação perfeita da salvação adiada.
Caminho sem saber qual o destino que me aguarda do lado invisível das coisas que ficam por dizer.
Guardo cada memória pelo tempo absolutamente necessário, até conseguir libertar-me do medo.
Anseio reconhecer em mim os sinais do retorno da certeza que residia no lugar de mim.
Correm lágrimas pela minha pele a lembrar-me que o caminho é feito do que ficou na dor e no frio do ter podido ser.

Caminho descalço sobre meu próprio corpo feito em pedra.
Um aroma a jasmim na noite enovoada pela insónia.

Cheira a jasmim enquanto tudo arde por dentro da vertigem.

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