15/01/2011

cao.s

Partes como se partir fosse chegar de forma inversa.
Deixas o espaço da casa da mesma forma como o encontraste. O caos caído sobre si mesmo.
Restam beatas e cinzas espalhadas na pele da madeira. Gotas e manchas, suor e sexo, lágrimas e sangue. Por entre lençóis e vidros quebrados, não ficou mais nada senão o pó.
Um caos aberto sobre si mesmo.
Há uma música a rezar o princípio da noite. A música sempre. Ligada a bramir o teu chorar em notas reproduzidas contra a necessidade inevitável do silêncio que a noite traz.
Tenho o corpo a dançar em náusea.
Tenho a náusea a dançar-me no corpo como se não tivesse mais como respirar.
Partes como se chegar não fosse mais do que este abismo aberto no caos de mim.

Segura-me nas mãos. Vou cair.
" O Mundo é um pensamento encadeado. quando algo se consolida, os pensamentos libertam-se. quando algo se desfaz, os pensamentos encadeiam-se."

Novalis

12/01/2011

ouço o teu respirar na pele das costas e não me sinto capaz de me virar no corpo













"If at first you don’t succeed, put yourself up and try again
Try again"
Tens os lábios suspensos na marca de água onde caíram as palavras antigas. Nos pés não há soalho que não esteja apodrecido pelo tempo passado sem piedade sobre os rasgos da humidade que te cobre os cabelos. Ouço-te rezar quando fecho as janelas e impeço o resto do mundo de devastar o que resta da tua solidão. Aqui dentro não há perigo. Sabes bem que aqui dentro não há perigo.
Olho-te por detrás dos vidros e percebo que nunca compreendi – verdadeiramente  -rigorosamente nada do que te fazia mover. Sempre soube a selvajaria que acontecia dentro do teu pensar mas nunca pude saber a verdadeira dimensão das coisas que te consumiam.
Suspendi-me nas palavras que tinha para te dizer e remeti tudo ao silêncio que só as almas velhas sabem manter. As palavras, tuas, caídas longe das minhas, mais não poderiam ser do que o reflexo da nossa eterna incapacidade de ser o que restava de nós.

09/01/2011

água

Fecha-me nas mãos que são tuas feitas de água. Encerra-me no sonho que é teu feito de deserto infinito. Guarda-me nas palavras que jamais serão proferidas. Entoa-me nas preces aos deuses esquecidos. Sorri no olhar que é meu e que tens dentro de ti na certeza de que, um dia, eu vou chegar a chegar junto do lugar que tu ocupas fora de mim. Prometo que vou tentar serenar o passo e seguirei na marcha de um cavalo negro de encontro ao sol que se vai por na margem do deserto que gerámos em nós. Antes de partires, vou segurar as tuas mãos feitas de água e vou beber-te, inteiro, até mais não poder. Antes de eu partir, tentarei ter chegado a tempo da tua espera.