28/11/2019

neVoa

deita-te a meu lado. vou dizer-te porque não importa se morro agora. 
deixa-te ficar um pouco. prometo que não me alongo na explicação de que tudo isto se resume a um lugar que tu não conheces. 
nada tem de mudar esta noite. nada tem de ficar diferente. 
é só ficares aqui um pouco mais e vou ser capaz de te mostrar, nas palavras e nos gestos, no fundo do meu olhar, porque é que não importa se partires amanhã quando o dia cair de debaixo da neblina do rio. 
por muito que te possa dizer tudo o que tenho para te dizer, não quero que chores. por favor não chores. não suporto ver-te sofrer. 
abraça-me na angústia das palavras que não me dizes e deixa-te repousar na estranha sensação que tenho quando te sinto a ficares sem ar por dentro da ausência que reside em ti. 

deita-te a meu lado. prometo que morro antes da manhã chegar. 

25/11/2019

I'll faut que tu peux comprendre ce je que je ne peux pas te dire avec des mots.
Ça c’est que je vais t’ aimer jusque a la fin, sans jamais te toucher.
Je sais que je t’aime en plus, pour cela. 
E je vais t‘aimer sans, jamais, avoir connue ton âme par dedans.
Et ça, ne pourra pas changer.

23/11/2019

trazes na ponta dos dedos os contornos do meu abismo. o desenho das minhas costas. as sombras do meu corpo. 
trazes nos contornos das mãos, a minha indelével obra.

quando olho para dentro do que há em ti, revejo-me nos passos que dás quando me deixas ficar só.
quando partes.
quando me abandonas.
mas é quando eu te abandono que reconheço os lugares certos de tudo. 

trago nos dedos o começo do teu deserto. o contorno da tua face. a luz da tua alma. 
trago nas mãos o tempo que tivemos junto ao mar e escrevo teu nome na areia. 
desenho-me no voo das asas de uma gaivota enquanto aguardo que o tempo chegue. 
de ficar.

ou de partir?

trago-te nas mãos de tinta que verto sobre a maré até desaparecer no voo das ondas. 

21/11/2019

saLida

desces as escadas. de pedra. as paredes, em torno, brancas. as escadas da cor de terra.
paras a meio do caminho. o peito a latejar. um som persistente por dentro a pedir que não pares. o corpo a consentir continuar.
o frio consome-te por dentro da pele. faz frio neste lugar. mas continuas. no sentido descendente. a aguardar que saibas o momento certo para sair por uma porta. 
intentas desafiar a intuição e cedes em cada patamar. anseias que algo te indique o caminho. 
portas fechadas. paredes fechadas. o corpo fechado. 
desces o frio do caminho. por dentro do que acontece em ti. em torno das paredes que te albergam. 
decides que não paras até encontrares o caminho. 

20/11/2019

é a náusea a começar por dentro. o peito a latejar. a boca seca. a dor...

toca-me. 
se puderes. 
toca-me.
se conseguires.
leva-me.
se tiveres força.

é a náusea a tomar posse de mim. por dentro. a apodrecer-me por dentro. a levar-me para dentro. a destruir-me.

conduz-me.
se souberes como.
salva-me.
se puderes.
sossega-me
se conseguires.

sinto por dentro o mundo inteiro a consumir-me. a apoderar-se de mim. a afogar-me. a escurecer-me mais. um pouco mais.

toca-me
se puderes.
salva-me
se conseguires
respira para dentro de mim
se souberes como. 

17/11/2019

PorTo

A incapacidade de dormir queda sobre a cidade como cacimba. As ruas humedecem com a dança da chuva e as pedras ficam mais escuras. 
As folhas nas árvores cinzentas projectam-se sobre o pavimento dos espaços por onde caminhas, como pétalas de flores esquecidas pelo tempo.
A cidade tem camélias por detrás dos muros antigos onde nascem e vivem memórias de outros passos. 
Há um aroma a saudade e a tempo. Tudo te sabe a vida e sentimento.
Atravessas as ruas despidas sobre o frio que vem com o fim de Novembro e não sabes, ao certo, para onde te diriges. Talvez norte. Talvez sul. Talvez apenas a possibilidade de ir seja tudo o que te basta neste preciso momento.

A cidade adormece, inteira, em teus braços, assim que a noite chega. 

14/11/2019

segura-me na ponta da língua. 
despe-me, até não ficar nada sobre a pele. 
ama-me como se amanhã não pudesse existir e não houvesse mais nada em que fosse possível crer.
toca-me como se o mundo inteiro parasse por dentro das tuas mãos. 
acolhe-me até eu ficar sossegado. 
abraça-me até ao fim da noite inteira. 
ama-me até não ficar nada por dizer. 
canta-me enquanto houver música por dentro de ti. 
vaza-me de tudo o que não importa, até a esperança ficar a dançar de frente para nós. 
guarda-me no silêncio sagrado que existe na tua voz até meu abismo não ser mais do que um grão de areia na praia que é teu corpo. 
cobre-me com o manto de água que é tua liberdade até eu ser mais do que chuva. 
ama-me enquanto eu me desfaço dos segredos e me separo do peso que insisto em carregar pelas estradas que me levam até ti. 
segura-me na boca. 
despe-me nas mãos. 
ama o que resta de mim enquanto eu posso. 
se eu soubesse, teria ido mais longe
se eu soubesse, teria chegado mais fundo
se eu soubesse, teria sido mais longe
se eu soubesse, teria sido mais fundo
se eu soubesse, teria tentado mais,
sido mais, 
querido mais, 
lutado mais. 
se eu tivesse sabido, 



teria sido tudo diferente. 

11/11/2019

CarCerEm

Tenta compreender...
se eu sair, vai ser insuportável voltar. Estou fechado há tanto tempo que quase esqueci a vida que havia lá fora, quando eu era livre. Compreendes?
Se eu sair, mas tiver de voltar, vai ser absolutamente insuportável.
Compreendes agora?

MarGe

o teu lugar não guarda espaço para o lugar de mim.
tuas mãos atravessam meus cabelos como se eu não existisse.
teu olhar evita o meu como se eu carregasse o inferno inteiro dentro do peito. 






respiro debaixo de água para segurar a ânsia de te abandonar no leito do rio. 

MaTer

Desapareces, aos fragmentos, de cada vez que o vento sopra de nortada. 
O vento invadiu a praia, teu corpo, tua essência. 
Também chove por dentro de ti. Sempre choveu. Uma tempestade incessante que nunca te deu tréguas. Que nunca te trouxe paz. 
Olhas, com o olhar vazo, o mundo que te consome. Tudo voa nas asas do vento. 
Hesitas no passo. 
Transportas o peso inteiro do mundo preso, agrilhoado em ti, imutável. 
Por mais que tenhas - antes da nortada chegar - tentado fugir deste lugar, não te foi possível. 
Não tem importância agora.
Vou tentar seguir-te neste caminho à sombra do vento que vem do norte, até chegar o momento certo de voarmos com o resto.  

04/11/2019

hiEr

deita-te sobre meu corpo. 
serei teu leito. 
adormece nas minhas costas. 
serei teu sonho.
respira na minha pele. 
serei teu ar.
navega-me na alma. 
serei teu leme.
despe-te nos meus olhos. 
serei teu corpo.
silencia-te. 
serei tua voz.
viaja sem medo de não regressar.
serei teu mapa.
vem.
serei tua confirmação. 




01/11/2019

esperei que os caminhos se encontrassem no final da viagem.
entendi que não importava o quão depressa se vai porque, na realidade, é a vontade de ir que conta.
tudo se move do lado de fora da noite. danças até esqueceres que existes. gritas até emudecer. desfazes-te no vidro até deixares de ser.