28/11/2020

rAzÃo

Não compreendo o motivo pelo qual fico suspenso nesta espera sem sentido 

pois sei 

com toda a certeza que cabe dentro das coisas certas

que nunca seria possível chegares. 


Não compreendo porque me permito o engano perfeitamente desenganado

e me alimento dele para respirar um breve momento mais

enquanto invento motivos para me esquecer de parar.


Não compreendo porque este lugar chegou até ao espaço de ti

que sentido nenhum fazes dentro de mim

mas que o olhar por dentro de tua voz me tocou como se fosse ferro 

e eu 

apenas fosse feito de pó. 

 

Compreendo 

agora 

porque me permito permanecer a dançar nesta doce ilusão porque é enquanto a (des)verdade me mantiver à tona 

eu me suspendo num lugar em que é permitido continuar a respirar.

16/11/2020

eScaRpa

Desenho te na linha das escarpas

de frente para o lugar onde as ondas chegam 

para gritar -

para cantar - 

para erodir - 

para esculpir -

para devastar - 

para recriar - 

para afogar - 

para libertar - 

a rebentação das ondas que suportam o impacto da tua ausência nas rochas que enegrecem no sabor do sal.

aguardo que olhes para mim. não. que me vejas. não. que me saibas. não. que me reconheças. 

lanço-te do cume das rochas e assisto à tua queda. não verto nenhuma lágrima. não fecho os olhos. apenas sigo no grito das ondas, atrás de ti.

lambe a morte de dentro da minha vontade e conta-me uma história de adormecer. 

eu só queria que pudesses tirar-me de dentro de mim. uma vez apenas. seria o suficiente. 

o mundo não pára lá fora. sabes bem que nada pode parar. 

sabes também como a vida tem apenas um destino e que no caminho até lá não podemos deixar de seguir. em frente. 

leva a vontade de dentro da minha morte e adormece a lado da minha vigília. 

15/11/2020

Aspettami

fico à espera. 

de encontrar. de saber. de chegar. de confirmar. de entender. de parar. 

espero enquanto esperar for a forma de te encontrar. de me saber. de sermos, de certa forma, uma e a mesma única coisa. como se eu só pudesse ser, verdadeiramente, depois de te encontrar. 

fico à espera na esperança de chegar até ao lugar certo do caminho que não escolho, que me escolhe, que me espera na espera em que me encontro perdido. talvez esteja à espera para me encontrar. para saber o resto que falta de mim. para assegurar. para deixar de estar sempre a sentir-me suspenso nos teus dedos sem que realmente me saiba nas tuas mãos. 

vou na demanda mas permaneço parado. quieto. num tumulto insaciável que aguarda serenar. porque te sei e porque espero a esperar saber esperar da maneira certa. fico à espera do teu encontro mas não te tenho ainda em mim da forma como espero poder esperar ser a certa. a única forma certa de esperar.  

talvez não espere o que espero mas sim o que esperava esperar quando a espera se torna profundamente tudo o que sou. ou talvez eu seja tudo o que posso ser sem ser ainda, ou ter já sido, e a espera do que se pode encontrar, depois de mim, seja o que me consolida na espera(nça) de chegar a ser exactamente o que sou suposto ser. em ti. depois de ti. contigo. sem mim? comigo?

fico à espera. de entender tudo o que falta entender. de confirmar o que falta confirmar. de chegar onde é suposto eu estar. de saber o que eu sou. de encontrar as tuas mãos. de parar junto a ti. 


14/11/2020

NoRTada

procura por mim no vento que vem de norte



estarei no lugar das ondas. 

11/11/2020

 A vida começa a terminar no momento exacto em que compreendes o significado que reside dentro da impossibilidade. 

10/11/2020

 Há um cavalo negro a correr desenfreado por dentro do meu peito. 

08/11/2020

EucaliPto

 As paredes exalam um aroma a eucalipto que escorre na ponta da tinta em que alguém escreveu o lugar do mundo.

Corro, descalço, com a pele a beijar a lama fria, enquanto o inverno encontra o lugar certo dentro do poema que se faz em mim.

Meu corpo parece permanecer parado no mesmo lugar enquanto, na verdade, corre até a pele cair em lágrimas quentes de suor que lavam a certeza da queda premente. 

O chão permite-se cobrir das folhas vermelhas que se precipitam dos plátanos cansados que seguram as orlas do jardim, enquanto cantam o último suspiro. Como se fossem cisnes preparados para partir.

As paredes em torno deste jardim contam uma história. Basta que feches os olhos, que abras as asas e o peito, e poderás ler tudo o que ainda não foi escrito. Como uma viagem que se começa. Como um poema que ainda só se sente. Como um caminho que, temerosamente, se enceta. 

Tudo a exalar, na pele que navega os lugares de lama, o aroma triste de um eucalipto que chora.