15/11/2016

inVerno



Percorro o tempo que se instalou dentro de mim com a ponta dos dedos. Está frio lá fora – sabes que o inverno vem a chegar? – e começo a sentir o peso da minha roupa  vaza de corpo. Pego nos restos da tua voz e coloco-os sobre o meu escutar. Estou cego – sabes que o inverno vem a chegar? – como se vivesse na parte mais funda das noites que não sabem terminar em nós. Tento ver-te no fundo do meu vazio e não te encontro no corpo, não te sei na voz, não te escuto no tempo. Sei que o inverno vem a chegar. Guardo-me na ponta dos dedos e fecho as mãos. Espero que chegues.

luAr

Foi no segredo do luar que nasceu no dia angustiado que comecei a rezar. Entoei todos os cânticos que não aprendi e reservei-me no lugar mais fundo do começo da noite. Extasiei-me perante a imensidão da luz que me atravessou e corri dentro da minha nudez a tactear o ferro do chão. Cresceram sebes e flores no silêncio das palavras adormecidas e dancei com os espíritos do meu passado. Gritei ao vento o meu nome e deixei-me cair sobre o frio da madrugada. Passei o tempo inteiro de mim no relento da minha vida. E comecei a rezar até me encontrar na voz e recomeçar o dia.