Não venho aqui ouvir os pássaros
Venho
lacrar a vossa ausência.
Recolhes-te
dentro da tua angústia
por debaixo dos seixos negros
na orla da costa que respira a lava que
quem
olha de fora
não consegue
ver.
Fechas
teus olhos
como quem
fecha as mãos
e
ficas
virado para o interior das tuas ausências
com a dor
a apontar
o caminho
que
fica
para
norte.
Seguras
em silêncio
todas as mágoas do mundo
que colide
com todas as areias
perdidas
nos caminhos
do deserto
que te devasta
por dentro
a cegueira do caminho
que
de frente para ti
te foge das mãos
fechadas.
Somente
o tempo
vestido do negro dos seixos
despido do silêncio do mar alto
te poderá
trazer
de volta
ao caminho
onde
deixaste
teus olhos
abertos.
Toca-me.
Mais uma vez.
Prometo que não fico.
Prometo
que
não volto.
Deito-me, despido, sobre o beiral do tempo. Conto cada dia
que passou nos dias que foram noites e sei o tempo todo que estive suspenso na
tua sede.
Sei a fina lâmina que me lambe o lugar escondido que tuas
mãos ocuparam no interior de meu corpo vazio.
Deleito-me na sôfrega certeza (ou somente memória) da
vontade de me vestir dos contornos da tua desvontade.
Intento entregar-me (nu, descalço, com labaredas a emanar
dos contornos da pele), à fealdade da violência que abraça a tua ausência
quebrada no lugar vulnerável da condição de se não poder ser nada para além de
selvagem.
Mas tua voz é sempre o meu lugar de redenção. O lugar onde o
sol repousa. Onde o mundo para de gritar.
Sorvo cada som vibrado da tua fala, cada tom a saber
tornar-se nos fios com que me defino na forma inteira, e tuas palavras e o
aroma de tua pele nos meus dedos, são tudo o que me alimenta.
Transcendo a essência do ar que respiras longe de mim.
Quero-te tanto quanto te não quero.
Desejo-te tanto quanto te não suporto.
Toco-te.
Uma última vez.
Prometo
que
não
volto.
quedam
desenfreadamente
sem rédeas ou amarras
rajadas oceânicas de chuva
que limpam esta terra
e nela desferem seus golpes impiedosos
disfarçados nos fragmentos da névoa que tudo abraça
cegamente
no rescaldo do ruído do cinzento
e a única coisa que me podia salvar
do dilúvio
seria
se o por do sol que reside dentro da tua voz
pudesse chegar até ao aqui.
Toca-me
no canto mais putrido de minha pele
no ângulo mais sujo de meu abismo
no resto mais devastado da minha continuação
na letra mais tosca da única palavra que me habita a lingua.
Diz-me tudo o que sabes
sobre as linhas tortas do meu destino tortuoso
sobre a cor da sombra dos meus dedos arrefecidos na queda do dia
sobre a rugosidade dos calhaus secos que me colhem a pele e me cobrem os olhos abertos
Grita
no meu ouvir
no que já não sei sentir
no que é sem ser e é por já ter sido
e
depois
peço-te
abandona-me ao vento.