18/07/2017

me myself & i

sou um lugar em que nada começa e em que tudo termina e não cresce, em que tudo nasce sem razão e em que não há razão em nada do que sinto e o que sinto são coisas imensamente distantes e estranhas e confusas e difusas e o que vejo são precipícios em que me quase que quedo e em que me quase que despedaço sem ter nunca começado verdadeiramente a caminhar e em que o caminho é sangue em feridas abertas ao sal das lágrimas que, em silêncio, desvelo e em que a terra que penso ter sobre os pés é apenas areia e em que os meus passos são apenas as sombras do que resta de mim quando tudo o que acontece por dentro me rouba as palavras e me desfaz a linha do pensamento e que dança dentro de mim e eu perco o norte e perco o sul e perco todos os pontos cardeais e deixo de poder contar seja com o que for, seja com quem for, e em que não encontro nada porque tudo o que está em mim está além de mim e aquilo que sofro ninguém entende nem ouve nem sente e eu não me consigo tocar nos dedos não me consigo tocar nas feridas não me consigo encontrar dentro de mim e sou um lugar em que termino sem ter chegado a começar porque de cada vez que dei lugar ao movimento, caí dentro de um vórtice dentro de uma aresta, dentro de um degelo dentro de um abismo, dentro de uma solidão tão estranha em mim, e procurei - confesso que procurei - por mim em todas as vozes em todos os ruídos em todas as pessoas que se puseram entre mim e mim e entre mim e o fim e entre mim e o começo e entre mim e outro lugar em que eu não precisasse de acordar, em que eu não precisasse de ser, em que eu não precisasse de nada para poder continuar, mas algo em mim me consome e dilacera, me termina e me assusta e me conduz a um lugar que não conheço dentro de mim e que não sei explicar e que não gosto e que me segura com garras fundas de noites inacabadas em que a única coisa que me podia salvar eram os que não estiveram não entenderam não souberam ouvir não quiseram ficar e não me agarraram nas mãos nem na alma, que me podiam ter segurado nestes finos fios de seda que ainda me prendiam à vida e por isso sou o lugar em que já nada pode começar porque tudo já teve o seu lugar e agora sou o que sou dentro de mim e não tenho as palavras que me possam libertar deste lugar em que uma parte de mim permanece sem poder fugir e outra onde me desfaço na mais absoluta solidão dentro do que resta de mim.

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