Não me fales da morte enquanto
aqui estou. Não me olhes como se soubesses que o meu mundo vai terminar. Não to
permito. Deixa-me estar dentro deste lugar que reservei à minha sólida angústia
de me saber vivo enquanto morro. Deixa-me caminhar e deixa-me correr até eu
cair. Deixa-me segurar nos dedos a areia fria da praia que ainda existe em mim e
deixa-me dançar como se amanhã a música não fosse terminar. Deixa-me gritar as
vezes que eu quiser, o nome que eu quiser, e não me julgues. Nunca me julgues. Quero
ser quem decidi ser até ao fim do que começou em mim. Não me questiones, não
perguntes porquê. Deixa-me ir assim, na ilusão de que não parti e na certeza de
que o mundo continuou a acontecer apesar de mim. Deixa-me sonhar na minha
infinita tristeza de ter de partir, mas permite-me ainda sonhar. As vezes que
eu quiser, as vezes que eu precisar, deixa.me sonhar que ainda estou aqui e que
meu caminho pode ser mais longo, pode ser mais inteiro, pode ser mais do que
apenas isto. Deixa-me olhar-me no espelho para me recordar quem fui, não este
corpo que vejo agora aqui de fronte da minha finitude, mas aquele que bailou a
vida sem ter medo de cair. Lembra-te, nunca tenhas medo de cair. Há sempre areia
para te segurar nos dedos. Há sempre mar dentro de ti. Dentro de nós. Dentro do
olhar que encerro e se despede em mim. Não me fales da morte enquanto ainda resiste uma réstia de vida em mim.
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