Está tudo a desparecer. A desvanecer.
A transparecer a antiguidade e o desespero. As paredes choram o salitre e a tinta desfaz-se na inteireza do pó que já não abandona este lugar. Caem as
madeiras e os tectos. Rangem os soalhos e as desgraças. Reza-se a história e
desaparecem os personagens. Aqui e ali há um resto de uma memória apagada no
rastro frustre das asas de uma gaivota adoecida pelo ondular do mar. Nada faz
falta aqui se não um recomeçar. Do princípio. Longe deste fim que se aproxima
com a velocidade das coisas que se não desejam. Queria partir e não consigo. Meu
corpo está preso nas garras do que não chegou a ser a vida que era suposto ter
sido vivida. Está tudo a desvanecer. A cair. A apagar-se. Vai ficar apenas este
enorme lugar onde tudo se passou como se nada tivesse sido. Cedem as madeiras e
cedem os telhados sobre o voo de uma gaivota envelhecida. Gritam as ondas e
grita o vento e gritam as vozes dos que morreram aqui e deixaram tudo por
terminar. Cai a tinta das paredes e caem as paredes dentro de si mesmas e levam-nos
consigo. As memórias são apenas pó do que restou aqui a marcar os lugares
certos das coisas incertas. Queria ter podido ter a liberdade de partir para
sempre e para sempre estou condenado a ser o pó deste lugar. Indefinidamente,
até que a minha existência seja, serei o lugar em que tudo desvanece e queda,
como uma gaivota que em pleno voo desiste de existir e desafia a gravidade até
encontrar o que possa ser o seu lugar certo para a queda.
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