28/01/2024

Ponho a cafeteira ao lume. Agora resta esperar. Fico, descalço, a tentar compreender o porquê de ser tão frio este mármore. Espero. Creio que estou a respirar mas não posso garantir. Não sei ao certo os movimentos que meu corpo ainda insiste em fazer. Fico, parado, à espera que algum aroma emerja dentro da minha apatia.

Sinto que a pele dos pés grita no silêncio que anuncia o vazio deste lugar. As dores mais fundas não se gritam, só se sabem. Penso em como tudo, de repente, adoeceu. As palavras atropelam-se e desferem golpes fatais sobre as bocas e as (des)esperanças. As mãos trazem veneno nos abraços ludibriosos ( ou ludibriados?) e já nenhuma parte de parte alguma quer ficar para (re)encontrar uma possibilidade que seja de (re)haver um todo. Os olhos trazem a (des)ilusão e o (des)anúncio. Temo que já não queira mais ver. Talvez também tenha chegado o mármore ao meu olhar e eu acabe a morrer de frio por dentro. 

Tenho o corpo descalço e a pele fria. Tenho o olhar cego a aguardar que este lugar fique emerso num aroma que me faça (des)acreditar que podia estar noutra parte de outro (des)lugar. 

Espero. Sorvo o café com os lábios cansados dos gritos que se (des)aconchegam dentro da boca. Compreendo agora a razão do frio que emana do mármore despido sobre meus pés (des)esperançados. 

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