24/10/2024

Pego no vidro com as duas mãos.  

Parto-o em duas partes desiguais. 

Com a mão direita, seguro a parte mais larga do vidro e rasgo a mão esquerda.  Até chegar aos ossos. 

Com a mão rasgada, seguro o lado mais estreito da segunda parte do vidro e enterro-o na minha mão direita. 

Carrego os vidros nas mãos desfeitas e caminho até à entrada do rio. Sujo a ferrugem ocre do lugar de embarque e acinzento o olhar do rio sobre meu sangue escuro. 

Entro no navio que navegará a imensa vastidão do oceano durante a noite velejada ao sabor do outono triste. 

O mar entoa uma melodia azul. Uma melancolia inevitável. 

Fecho os olhos para escutar as ondas e o escorrer de mim. 

Quando chegar a meio do oceano, estarei exangue.

Quando atracar, o vidro estará inteiro.

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